Abolição da escravatura

Após a abolição

As consequências económicas da abolição da escravatura em Bourbon
Autor
HO Hai Quang

Economista


As consequências económicas da abolição da escravatura em Bourbon

A primeira abolição da escravatura nas colónias francesas (1794) não foi aplicada na ilha da Reunião. A segunda foi decidida por decreto de 27 de abril de 1848, promulgado na Reunião por Sarda-Garriga, Comissário-geral da República, a 19 de dezembro de 1848, tendo os escravos da ilha sido alforriados no dia seguinte. No entanto, embora houvesse sido oficialmente abolida, a escravatura não foi efetivamente suprimida de imediato.

Com efeito, devido à carência de mão de obra, alguns plantadores enviaram recrutadores para África com a missão de comprar escravos que alforriariam imediatamente, fazendo-os, de seguida, “assinar” contratos com um vinculo de dez anos e, por vezes, sem limite de duração.

Formalmente, os homens e as mulheres assim recrutados chamavam-se “engagés” (contratados ). Na realidade, tratava-se de uma escravatura disfarçada que levaria cerca de trinta anos a desaparecer.

Como consequência da Abolição, toda a organização económica da ilha foi afetada. Para o governo e para os plantadores, a primeira prioridade era reorganizar a economia de plantação com novas fundações (I). Para esta reorganização funcionar, foi necessário criar um banco (II). As transformações da economia da plantação levaram ao surgimento de um pequeno sector comercial e à criação de explorações agrícolas à escala micro. Além disso, os alforriados não integrados na economia da plantação tiveram de se reorganizar a fim de sobreviver (III). Contrariamente aos receios da época, a abolição da escravatura não gerou uma catástrofe económica, bem pelo contrário (IV).

 A restruturação da economia da plantação,
da escravatura ao salariado forçado

Apresentação geral dos dois sistemas

A escravatura é uma relação de domínio/submissão absoluta estabelecida entre duas pessoas, uma das quais é a proprietária da outra. Quando esta relação é generalizada, torna-se então a base de um sistema económico e social, o da escravatura, sendo criado um conjunto de regras que definem os direitos dos senhores sobre os seus escravos e implementados instrumentos de repressão para as fazer cumprir.

Na Reunião, a escravatura foi instaurada progressivamente entre o final do século XVII e o início do século XVIII. Todavia, foi somente após a promulgação do Code Noir (Código Negro), em 1723, que tomou a sua forma definitiva. O seu objetivo era permitir à Companhia das Índias francesa estabelecer plantações de cafeeiros e enriquecer através da exportação de café para a Europa.

No início do século XIX, os cafezais foram destruídos por ciclones e a Inglaterra apoderou-se da ilha Maurícia, que até então havia fornecido açúcar à França. Os plantadores da Reunião aproveitaram a oportunidade para desenvolver a economia açucareira que, na altura, se encontrava na sua fase embrionária. Em 1848, as propriedades açucareiras da Reunião operavam com base num sistema esclavagista que pode ser representado da seguinte forma.

 

O sistema esclavagista

 

Após 1848, este sistema teve que ser completamente remodelado porque os senhores tornam-se “patrões” e os escravos haviam sido alforriados. Concretamente, a propriedade do senhor sobre a pessoa do seu escravo tinha sido suprimida e o Code Noir, que já não tinha qualquer razão de ser, desapareceu. A partir daí, tornou-se indispensável organizar outro regime de trabalho baseado na compra e venda da mão de obra do produtor imediato. Simultaneamente, tiveram de ser criadas novas regras jurídicas para formalizar a relação entre empregadores e trabalhadores.

Nada mudou no domínio das relações técnicas laborais: os “bandos” de trabalhadores labutavam arduamente sob as ordens dos comandantes. As tarefas a desempenhar e os horários de trabalho permaneciam semelhantes aos do regime esclavagista. Porém, aquilo que se transformou fundamentalmente foi o estatuto social do produtor direto: este deixou de ser escravo, para se tornar um assalariado forçado, que:
• era juridicamente livre, mas privado de qualquer meio de produção;
• era autorizado a vender temporariamente a sua força de trabalho em troca de um salário;
• possuía um contrato de trabalho que estabelecia tanto o salário como as condições laborais;
• tinha um contrato, válido por vários anos consecutivos, que não podia ser rescindido em momento algum: daí a utilização do termo “forçado” em vez de assalariado livre.

A tabela seguinte especifica as diferenças entre o estatuto de escravo e o de contratado.

Liberdades e direitos Escravo Contratado
Religião Adesão obrigatória à religião católica apostólica e romana. Liberdade
Casamento Com a permissão do senhor. Proibição de casamentos inter-raciais e casamentos entre alforriados e escravos. Liberdade
Direito de reunião Proibição de reuniões com escravos de outras propriedades Liberdade limitada
Comércio Proibição de comprar e vender, exceto com a permissão do senhor. Liberdade
Propriedade Os escravos não podem possuir nada. Direito de propriedade
Deslocamento Proibição de deixar o domínio sem a permissão do senhor Deslocamentos controlados
Ações na justiça Incapacidade jurídica Capacidade jurídica

 

O esquema abaixo permite visualizar o sistema do salariado forçado, a base da nova organização económica que se seguiu à escravatura a partir de 1849.

 

O sistema de salariado forçado

 

Como é que este novo regime foi implementado?

A implementação do salariado forçado

O salariado forçado que se aplicava aos alforriados não foi organizado da mesma forma que o dos imigrantes.

Os alforriados: do salariado forçado e obrigatório ao trabalho obrigatório
O salariado remunerado e obrigatório aplicável aos alforriados foi criado pela lei de 18 de julho de 1845. Sarda-Garriga inspirou-se nisto, emitindo decretos em 1848 e 1849, forçando todos os alforriados a alistarem-se durante um ou dois anos como trabalhadores junto ao seu antigo senhor. Este sistema de trabalho só terminou em dezembro de 1851. Como foi aplicado?

Uma pesquisa de terreno mostra que, em 1de janeiro de 1852, dois terços dos alforriados já não residiam nas plantações. Como podemos explicar esta diminuição considerável?

O trabalho salariado só pode funcionar se os trabalhadores forem remunerados. Todavia, em 1848, os pequenos plantadores não tinham os fundos necessários para pagar aos trabalhadores. É certo que o decreto que aboliu a escravatura preconizava que uma indemnização deveria ser concedida a todos os proprietários de escravos. Contudo, a lei que previa a indemnização só entrou em vigor a 30 de abril de 1849, outorgando a cada antigo proprietário de escravos da Reunião uma soma de 711,59 francos por escravo, que embora inferior ao preço médio de um escravo , era suficiente para pagar os salários. No entanto esta indemnização foi paga demasiado tarde: a primeira prestação (33,88 francos por escravo) só foi paga em outubro de 1849, e o restante saldo somente entre 1850 e 1852 .

Recusando-se a trabalhar de graça, um grande número de alforriados abandonou as propriedades produtoras de açúcar. Este movimento de deserção afetou os pequenos proprietários de terras que empobreceram drasticamente.

Porém, a causa da diminuição do número de contratados também reside na estratégia de alguns plantadores que optaram por expulsar trabalhadores improdutivos ou pouco produtivos dos seus domínios. Na época da escravatura, os senhores eram obrigados a garantir a subsistência dos seus escravos doentes, idosos, etc. Após a abolição, esta obrigação já não existia, sendo vantajoso simplesmente livrar-se deles, substituindo-os por contratados recrutados do estrangeiro.
O quadro que se segue resume as estratégias de mão de obra mais utilizadas pelos plantadores.

Estratégias dos plantadores Consequências
Pura desmobilização: O proprietário não contrata os seus antigos escravos nem trabalhadores imigrantes Abandono da produção. Os escravos alforriados encontram-se da noite para o dia sem comida nem dormida.
Atração-recrutamento: O plantador recruta os alforriados desmobilizados e os trabalhadores imigrantes. Aumento do número de trabalhadores e crescimento extensivo da plantação.
Desmobilização-recrutamento: O  plantador descarta os seus ex-escravos pouco produtivos, substituindo-os por trabalhadores imigrantes. O número de trabalhadores permanece constante, mas o grupo que formam torna-se mais eficiente.

 

Por razões sociais e políticas, era dificilmente possível manter o sistema de salariado forçado para além de 1851. A partir de 1852, o governo organizou um regime de trabalho obrigatório que se estendia a todos aqueles que não tinham os seus próprios meios de subsistência. Para tal, foi implementado um sistema de controlo.
• Os trabalhadores das explorações agrícolas e industriais tinham que possuir um contrato de trabalho.
• Os outros tinham que ter um livrete de trabalho.
• Aqueles que não possuíam estes documentos eram considerados como vagabundos.

A fim de reduzir a insegurança pública e a mendicidade, o governo alargou a legislação nacional relativa à vagabundagem à Ilha da Reunião, conferindo a este termo uma definição mais ampla do que na metrópole de modo a poder reprimi-lo de forma mais severa. De facto, esta legislação manteve-se praticamente sem efeito, uma vez que a administração colonial não tinha meios para a implementar.

O afluxo de imigrantes e o desenvolvimento do salariado forçado
Em 1815, o Congresso de Viena proibiu o tráfico de escravos. Embora tenha sido criado um comércio clandestino, isto não foi suficiente para que a Reunião mantivesse o seu número de escravos cujo número diminuiu de 71 000 para 60 300 entre 1830 e 1847. Além disso, esta mão de obra envelhecia.

É por isso que, a partir de 1828, a administração colonial e, em seguida, os plantadores organizaram a importação de trabalhadores indianos e chineses, sendo que foram elaborados alguns textos oficiais para reger as relações laborais. Todavia, este novo regime não se desenvolveu. Sobre-explorados, colocados na mesma posição que os escravos com quem trabalhavam, os trabalhadores recrutados revoltaram-se. A administração teve de repatriar e proibir qualquer novo recrutamento de imigrantes.

No entanto, depois da Abolição, tornou-se essencial reabrir as portas da imigração. Foi realizada legislação para organizar o recrutamento, o transporte e o desembarque na Reunião de trabalhadores contratados, bem como a sua distribuição entre os plantadores… Estes contratados eram trabalhadores que tinham assinado voluntariamente contratos de trabalho que os vinculavam duradouramente (cinco anos) ao seu empregador, sendo uma parte do seu salário pago em espécie e a outra em dinheiro.

As origens da emigração não europeia para a Reunião

No início, as remessas de imigrantes eram constituídas quase exclusivamente por homens jovens e robustos, mas depois a administração impôs uma pequena percentagem de mulheres. Em 1860, as mulheres constituíam 20% dos contratados presentes na ilha. No total, entre 1849 e 1881, quase 150 000 trabalhadores foram levados para a ilha da Reunião, principalmente oriundos da Índia, mas também de África e Madagáscar. Em 1881, perfaziam 46 450, 20% dos quais eram africanos, 65,9% indianos, 13,7% malgaxes e 0,4% chineses.

As origens da emigração indiana para a Reunião

No total, os imigrantes representavam 30% da população da ilha. Para alimentar os indianos recrutados, os plantadores tiveram de importar grandes quantidades de arroz. Até então, isto não tinha sido necessário porque os escravos tinham de se contentar com o que os seus senhores lhes davam, o milho que cultivavam formando a base da sua dieta.

A renovação dos assalariados forçados foi realizada de acordo com o princípio de uma bomba de sucção/expulsão: os plantadores recrutavam no estrangeiro; quando estavam desgastados, repatriavam-nos e contratavam trabalhadores novos.

A criação do Banco da Reunião

Durante o período de escravatura, a economia de mercado era pouco significativa e os escravos não recebiam dinheiro, pelo que os plantadores não precisavam de possuir capitais líquidos substanciais.

No entanto, a nova economia de plantação tinha que ser abastecida com créditos e dispor de uma massa monetária suficiente para funcionar corretamente. Porém, em 1848, não havia banco na Reunião. Fundada em 1821, a “Caisse d’escompte” tinha sido liquidada em 1826 e a “Caisse d’escompte et de prêts”, que a veio substituir, cessou as suas atividades em 1834. Para preencher este vazio, Sarda-Garriga criou, por decreto de 16 de abril de 1849, o “Comptoir d’escompte et de prêts de l’Île de LaRéunion”. Este banco efetuou um trabalho eficiente, mas a sua existência foi de curta duração. A lei de 30 de abril de 1849 ordenou a fundação, em cada colónia, de um banco colonial de emissão de moeda, empréstimos e descontos.

Instituído pela lei de 11 de julho de 1851, o “Banque Coloniale de la Reunion” substituiu assim o “Comptoir d’escompte”. O BR era um banco comercial: podia receber depósitos, emprestar capitais e conceder empréstimos a curto prazo. Detinha também o privilégio exclusivo de emitir notas, que só podiam circular na Reunião. Esta divisa tinha estatuto legal, o que significa que todos os credores, tanto públicos como privados, eram obrigados a aceitá-la como meio de pagamento. O privilégio de emissão é uma vantagem absolutamente considerável, pois significa que o BR podia, em princípio, emitir tanto dinheiro quanto desejasse, sem ter de suportar outros custos que não os da impressão das notas. Para evitar um abuso deste poder, era proibido emitir notas para além do triplo das suas reservas metálicas.

O capital inicial da BR foi fixado em 3 000 000 francos. Para angariar uma parte, estava previsto que dos 711,59 francos por escravo a receber, os antigos senhores cuja compensação ultrapassasse os 1000 francos receberiam sete oitavos, enquanto os restantes seriam retidos para formar o capital do BR do qual se tornavam acionistas.

Este estabelecimento abriu as suas portas em julho de 1853. A sua criação foi de extrema importância, na medida em que facilitou a transição da economia esclavagista, que podia funcionar com uma massa monetária muito reduzida, para uma economia capitalista que só poderia desenvolver-se plenamente caso tivesse um aparelho bancário capaz de fornecer crédito às empresas e emitisse uma oferta monetária proporcional às necessidades da produção e do comércio.

Atividades económicas periféricas

Os alforriados à margem da plantação

De acordo com um inquérito realizado a pedido dos plantadores, no início de 1848, a população servil que trabalhava em explorações agrícolas que empregavam mais de dez escravos ascendia a 48 698 pessoas, das quais 53% eram homens, 25,8% mulheres e 21,2% crianças . O que lhe aconteceu depois da Abolição? É impossível saber precisamente porque não existem estatísticas sobre ela, o que é normal, uma vez que a partir de 1848 apenas havia pessoas livres.

O que é certo é que a sua integração na economia da ilha foi extremamente difícil. De facto, enquanto os proprietários de escravos foram indemnizados, os alforriados não receberam qualquer compensação. Não poderia ser de outra forma. Não só não vemos em que base poderia ter sido calculada uma qualquer indemnização, como, sobretudo, atribuir aos alforriados uma parcela de terra ou uma soma de dinheiro, ter-lhes-ia permitido viver a partir dela e tê-los-ia tornado independentes. Por conseguinte, sem mão de obra, a economia da plantação teria sido dizimada, pelo menos momentaneamente, privando assim a metrópole de açúcar e arruinando os plantadores.

Alguns alforriados deixaram as plantações rumo à aventura nas partes altas da ilha onde, desde o final do século XVIII, grupos de colonizadores brancos pobres tinham começado a estabelecer-se. Tal como eles, sedentarizaram-se e criaram uma economia de subsistência que consistia na recoleção e em algumas atividades agrícolas rudimentares.

Outros alforriados foram capazes de se integrarem como trabalhadores de tarefas árduas nas mais importantes aglomerações costeiras. Outros foram contratados por homens livres de cor que se haviam tornado agricultores mesmo antes da Abolição. Com efeito, 5 865 escravos tinham sido alforriados entre 1830 e 1847, dos quais 299 agricultores que possuíam terras e escravos para as cultivar. No entanto, muitos não conseguiram reintegrar-se normalmente na nova sociedade. Para sobreviver, algumas mulheres não tinham outra opção senão dedicar-se à prostituição. As crianças, os idosos, os feridos no trabalho tornaram-se um subproletariado definhando nos arredores das aldeias. O primeiro hospício de Saint-Denis, que abriu as suas portas em 1850 viu chegar “de todos os lados, doentes, inválidos e idosos” . As epidemias causaram desolação no seio desta população.

A emergência de pequenos proprietários indianos

Ao contrário dos escravos que não eram remunerados em dinheiro e que não podiam possuir qualquer bem próprio, os trabalhadores contratados recebiam um salário que podiam gastar como bem entendessem.

Documentos oficiais da década de 1860 atestam a existência de pequenas explorações agrícolas detidas por contratados indianos. Na maioria das vezes, era terra indivisa pertencente a várias pessoas. O capital usado para adquiri-las provinha geralmente das poupanças que os indianos realizavam graças aos seus salários. Além disso, no final do seu contrato, alguns deles optaram por ficar na ilha de Reunião, assumindo pequenas parcelas de terra em arrendamento parcelário. Era uma espécie de arrendamento de terras em que o locatário tinha de produzir o que o proprietário ordenava e que era quase sempre cana-de-açúcar.

O colono tinha à sua disposição um pequeno espaço para montar a sua cabana, cultivar algumas plantas alimentares, criar algumas aves, porcos… A venda destes produtos proporcionava-lhe rendimentos. Foi assim que uma pequena classe de “agricultores-vendedores” pôde gradualmente emergir.

Alargamento da economia de mercado e emergência do pequeno comércio

Na época da escravatura, a economia de mercado era pouco difusa, porque os escravos não eram remunerados em dinheiro, pelo que a procura no mercado local era muito baixa. Só o comércio de grandes dimensões era considerável e dizia principalmente respeito às exportações de açúcar.

Com o surgimento da contratação tudo mudou: os contratados recebiam um salário que aumentava a procura solvível no mercado interno. É certo que não foi muito extensa porque em 1859 a Reunião contava apenas 65 000 contratados. Mas esta dimensão foi suficiente para atrair para a ilha novos imigrantes de Gujarat (Índia) e da China, sendo na viragem das décadas de 1850 e 1860 que começaram a chegar.

A origem da emigração voluntária indiana
Focos da emigração chinesa para a Reunião

Estes não eram contratados recrutados pelos plantadores, mas pessoas que vinham voluntariamente para se instalarem na ilha da Reunião e aí fazerem comércio.
Os contratados constituíam a maior parte da sua clientela. Os comerciantes chineses propunham principalmente produtos alimentares, ao passo que os comerciantes indianos eram especializados em tecidos e quinquilharia. Em todo o caso, tratava-se de microcomércios que garantiam aos que ali trabalhavam somente o suficiente para viverem, mas não para lucrarem.

Crescimento da economia de plantação e escassez de alimentos

O crescimento da economia açucareira de plantação pode ser analisado através de estatísticas. O quadro seguinte mostra a extensão das áreas cultivadas com cana-de-açúcar, o aumento do número de trabalhadores e a produção de açúcar.

  Área da plantação de cana (ha) Número de trabalhadores Produção de açúcar (toneladas)
1853 39 922 45 675 37 794
1859 64 207 70 457 61 978

HO Hai Quang, Histoire économique de l’île de La Réunion (1849-1881), p. 115.

Ao mesmo tempo, as superfícies consagradas à produção de víveres estagna, como indicado abaixo.

1852 1853 1854 1855 1856 1857
Víveres 33 831 32 209 34 107 31 038 34 120 23 137

Ministério da Marinha e das Colónias, Tabelas de população, cultivo, comércio e navegação para vários anos

À medida que o número de bocas para alimentar aumentava com a chegada dos novos contratados (a população passou de 100 000 habitantes em 1850 para 178 000 em 1860), a escassez de produtos alimentares fez-se sentir e os preços começaram a subir.

A Reunião, que outrora tinha sido o “celeiro das Mascarenhas” e um exportador de víveres, começou a importar cada vez mais. De 1840 a 1849, a importação média era de 15,7 milhões de francos por ano. O seu valor atingiu os 42,6 em 1859, quase triplicando numa década.

O arroz vinha da Índia, o peixe salgado da Terra Nova, as leguminosas e a carne de Madagáscar. Em 1857, a Reunião evitou a fome por um triz graças à introdução isenta de impostos de cereais nutritivos e à compra de arroz malgaxe a um preço elevado. Aprendendo com estes eventos, o governo tomou medidas para incentivar a produção de géneros alimentícios.

Conclusão

1 – Na véspera da Abolição da escravatura, a economia do açúcar era vítima de uma crise de mão de obra. Embora a Abolição tenha inicialmente agravado esta situação, também ofereceu aos plantadores que tinham os meios, a oportunidade de se livrarem dos seus escravos improdutivos substituindo-os por trabalhadores saudáveis e jovens, oriundos principalmente da Índia e de África.

2 – A escravatura, enquanto sistema económico, foi substituída por mão de obra contratada, que se define como um sistema de salariado forçado. A sua decomposição, a partir de 1882, traduzir-se-á no desenvolvimento de dois modos de produção: por um lado, o colonato (colonato parciário) na agricultura e, por outro, o salariado livre.

3 – Além disso, na periferia da economia da plantação, e no seu cerne, assistimos ao surgimento de um pequeno comércio a retalho (nas mãos dos chineses e dos indo-muçulmanos), bem como de uma propriedade de micro terras, base sobre a qual se formou gradualmente uma classe de “agricultores-vendedores” que se desenvolveria depois de 1882, com a extensão do arrendamento parcelar.

4 – De 1852 a 1960, os produtores de açúcar mais poderosos conseguiram expandir as suas propriedades, modernizá-las, aumentando, assim, a produção de açúcar. Por sorte, o preço do açúcar estava em alta. Para eles, era a “Belle-Époque”;

5 – Enquanto a riqueza se acumulava num polo da sociedade, no outro polo, os contratados e os alforriados não integrados na economia da plantação viviam na miséria. Estamos, portanto, perante um crescimento de exclusão. O Governador Darricau observou:

“Em todo o lado fiquei impressionado com um facto que me tocou profundamente: ao lado da mais exuberante das culturas, ao lado da mais magnífica produção, demarca-se a mais triste escassez; a riqueza num pequeno número de mãos, enquanto a maioria da população vive na miséria” .

Notas
[1] Escolha da tradutora
[2] Em 1847, havia 46 090 escravos na Reunião. O montante total é de 79 103 800. Portanto, o valor médio de um escravo perfaz 1716. Ministério da Marinha e das Colónias, Tableaux de population, de culture, de commerce et de navigation.
[3] A indemnização que cabe à ilha da Reunião ascende a 43 159 200 francos, decompondo-se em duas partes. Uma (2 055 200 francos) é paga em dinheiro, e a outra (41 104 000 francos) consiste numa renda a 5 %. O número de escravos tendo sido estimado em 60 651, a compensação por escravo totaliza 711,60 francos dos quais 33,88 francos em dinheiro e 677,71 francos em capital de renda.
[4] Patu de Rosemont, Rapport au Comice agricole de Sainte-Suzanne sur la question concernant le travail des affranchis, 1854.
[5] Dr. Azéma, Histoire de la ville de Saint-Denis de 1815 à 1870, p. 102.
[6] Antoine Roussin, Album de La Réunion, t. 1, p. 43.
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HO Hai Quang

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